A intervenção militar no Rio de Janeiro é apenas um show para a televisão

O que acontece no Rio hoje é o resultado de corrupção, mau planejamento, a falta de investimentos, descaso histórico e uma desigualdade social galopante.

Brazilian marines with armoured personnel carriers (APC) stand guard at the Museum of Tomorrow area in the portuary zone of Rio de Janeiro, Brazil, on July 29, 2017. Brazil has mobilized some 8,500 soldiers to Rio de Janeiro state to fight organized crime and a spike in street violence. President Michel Temer signed a decree allowing the use of the armed forces in Rio de Janeiro state, the official government gazette announced. / AFP PHOTO / Mauro PIMENTEL (Photo credit should read MAURO PIMENTEL/AFP/Getty Images)

O governo federal declarou intervenção militar na segurança do estado do Rio de Janeiro até o final do ano. Diz o decreto, apresentado nesta sexta-feira: “O objetivo da intervenção é pôr termo a grave comprometimento da ordem pública no Estado do Rio de Janeiro.” Trocando em miúdos: combater o que a imprensa vem chamando de “guerra” e “onda de violência” no Rio.

“Onda de violência” esta que é pior hoje em Sergipe, Rio Grande do Norte, Alagoas, Pará, Amapá, Pernambuco, Bahia, Goiás e Ceará, de acordo com os dados do 11º Anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que utilizou dados de 2016, os últimos disponíveis. Mas você não age onde não rende notícia.

A grandes redações se concentram no eixo Rio-São Paulo-Brasília, como o revelado pelo Atlas da Notícia, publicado no fim de 2017. Não é a toa que são os lugares sobre quais mais sabemos – e que parecem piores quando o assunto é violência.

Já está repetitivo falar isso, mas o que acontece no Rio hoje é o resultado de corrupção e mau planejamento, somados a falta de investimentos em pessoal e inteligência, descaso histórico – e complacente – e uma desigualdade social galopante.

Mas a aposta continua sendo em soluções plásticas e descoordenadas. O plano de segurança prometido diversas vezes por ministros e pelo governador nunca chegou. A decisão de intervir no estado foi tomada pela União mesmo depois de o governador ter pedido medida menos drástica. O Comando Militar do Leste não sabia da decisão até os 45 do segundo tempo. O Secretário de Segurança não foi consultado.

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Michel Temer assina decreto de intervenção federal no Estado do Rio.

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

A Câmara votará o decreto de intervenção federal na próxima segunda. A medida foi assinada nesta sexta pelo presidente da República, Michel Temer, por Pezão e pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia. Todos notórios personagens de atos de corrupção. Passaram um ano esperando dar mais merda para então apresentar uma solução “mágica”.

A falta de segurança é uma estratégia para quem vive de vender soluções. O Rio de Janeiro tem uma complexidade territorial e cultural peculiar, o Exército não tem poder de Polícia, não pode investigar crimes de civis. Por outro lado, militares que cometerem crimes durante sua atuação serão julgados por seus pares.

Se observarmos o total de apreensões de drogas feitas no Rio de Janeiro entre 2010 e 2016 é possível ver claramente a falta de planejamento: mais de 90% correspondem a pequenas quantidades. Em 2015, foram mais de 28 mil registros – 50% corresponde a uma média de 10 gramas por pessoa. Em vez de focar em grandes apreensões, a política de segurança se empenha em “respostas imediatas”, desperdiçando recursos e colocando policiais dentro das favelas pra matar e morrer por tão pouco.

A vida destas pessoas não pode ser reduzida a isso. O único projeto de segurança do Rio, as UPPs, faliu há anos e ainda não foi reformulado. O próprio ministro da segurança já disse mais de uma vez que falta planejamento por parte da Secretaria de Segurança Pública para a atuação das tropas. Já que o intuito é apostar na falida guerra às drogas: o Exército tem desempenhado sua função primária de cuidar das fronteiras, evitando que armas e drogas cheguem ao Rio?

Como atacar os efeitos e não as causas? Quem realmente vai ganhar com isso? Por enquanto nenhuma surpresa.

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